Descobrindo o sistema de crédito americano
Oi pessoal,
Finalmente arrumei um tempo para contar uma das minhas aventuras aqui na terra do Tio Sam, conforme eu havia prometido. Hoje estarei contando o que eu aprendi até o momento sobre o sistema de crédito americano. Importante notar que a cada dia aprendo mais e também este mercado está em constante evolução, portanto pode ser que eu tenha novos detalhes a serem acrescentados no futuro.
Por que estou contando esta história? Porque lendo os livros do Robert Kiyosaki e outros autores norte-americanos parece que é muito fácil financiar um imóvel nos EUA, mas a verdade é que “o buraco é bem mais embaixo”. Se o seu escore de crédito for ruim, você não consegue financiar nem uma casinha de cachorro.
Eu comecei a estudar este assunto por dois motivos, primeiro porque eu queria comprar uma casa financiada aqui (o que consegui em meados do ano passado) e porque quero ver se realmente vale à pena investir em imóveis por aqui. Nos dois casos não basta ter dinheiro, é necessário ter um bom escore de crédito.
No Brasil nós até o momento só temos sistemas do tipo “lista negra” (SPC, Serasa, Telecheque, etc). Este tipo de sistema lista apenas mal pagadores e não bom pagadores. Assim no Brasil não ter o seu nome em uma lista negra não significa necessariamente que você é qualificado para receber crédito.
Nos EUA o sistema é diferente. Existem três grandes agências de crédito (Equifax, Transunion e Experian) que monitoram a atividade das pessoas que moram nos EUA. Essas agências geram basicamente dois produtos: um relatório de crédito e um escore de crédito numérico baseado neste relatório.
No relatório de crédito são listados todos os produtos de crédito que você possui, em particular cartões de crédito, hipotecas e financiamentos. E o escore é um número que “resume” o grau de risco que aquela pessoa possui.
Todas as empresas que oferecem crédito mandam seus dados para as agências de crédito. Assim todos os meses os cartões de crédito informam às agências de crédito se você pagou em dia, o quanto você pagou, o saldo devedor, o limite de crédito que você possui etc.
Outro detalhe existente no relatório de crédito é quantas empresas nos últimos dois anos requisitaram os seus dados de crédito. Por exemplo, quando você solicita um cartão de crédito a empresa requisitará os seus dados de crédito, incrementando este contador. Este contador diminui o seu escore.
Esse sistema é um grande jogo. Se você for milionário e só comprar tudo à vista (casa, carro e não tiver cartões de crédito), então seu escore de crédito será baixo, por incrível que pareça, e muito possivelmente você não conseguirá um financiamento para comprar uma casa, por exemplo. Um equívoco comum é pensar que o sistema mede se a pessoa tem dinheiro ou não; na realidade ele mede se empresas estão propensas a emprestar dinheiro a você e se você é capaz de pagar suas dívidas em dia.
Portanto, como qualquer jogo, você tem que aprender as regras e jogar de modo a atingir seus objetivos. No meu caso, por exemplo, eu queria ter um escore de crédito que me possibilitasse o financiamento de uma casa com juros adequados, o que já consegui (contarei os detalhes futuramente). No momento trabalho para aumentar o meu escore para poder me qualificar para financiar imóveis de investimento de maior valor (ainda estou estudando o assunto, para ver se realmente vale à pena).
Em resumo, você tem que se endividar para aumentar o seu escore de crédito. Não é à toa que o americano médio está atolado em dívidas. O sistema facilita.
O problema é que se você pesquisar na Internet e em livros encontrará muita informação completamente errada sobre o sistema de crédito. E perguntar para americano também não é o melhor caminho, pois a maioria é “ferrado de grana” (outro assunto para contar em outra oportunidade).
Um exemplo do que a maioria das pessoas não entende. Mesmo que você pague os seus cartões de crédito em dia, as administradoras vão reportar que você tem um saldo devedor, que é o valor a ser pago (valor da fatura daquele mês), ao mesmo tempo em que indicam que a conta está em dia. Então uma dica que eu descobri é a de pagar os cartões de crédito em sua totalidade dois dias antes de seu fechamento. Assim quando a fatura é fechada, o saldo devedor é reportado como zero para as agências de crédito, aumentando o meu escore.
Outra coisa que eu tenho que trabalhar agora é para aumentar os limites de crédito nos meus cartões: a cada seis meses podemos pedir um aumento do limite de crédito. O problema que eu estou enfrentando agora é que meu relatório de crédito tem muitos pedidos (aquele contador que mencionei anteriormente), porque teve uma época que eu pedi um monte de cartões (quase todos recusados), que acabou ferrando o meu escore/relatório de crédito. Então estou “dando um tempo” para que este contador diminua para eu pedir novos aumentos.
Atualmente eu tenho três cartões de crédito aqui. Logo quando eu me mudei foi quase impossível conseguir um cartão. Preenchia tudo quanto era solicitação e todas eram recusadas. Obviamente porque meu relatório de crédito estava completamente vazio. Consegui um no banco onde tenho conta com um limite de crédito de US$ 1.000, que é baixo para os padrões americanos. Alguns meses depois resolvi responder a uma das zilhões de propagandas de cartão que eu estava recebendo pelo correio e consegui um cartão com um limite de US$ 500, que é o equivalente a cartão com limite de R$ 200 no Brasil, mas pelo menos já dava para “trabalhar” em rumo a melhorar o meu escore de crédito.
Esse cartão com limite de US$ 1.000 eu pedi aumento de limite de seis em seis meses como manda o figurino e hoje ele está com um limite de US$ 5.000. Aquele de US$ 500 seis meses após a abertura a administradora aumentou o limite para US$ 750 e seis meses depois para US$ 1.500, que é o limite que tenho hoje neste cartão. O terceiro cartão tem uma história curiosa. Pedi ele via Internet clicando em um anúncio, eles me deram o cartão na hora com limite de US$ 2.000. Passados seis meses pedi um aumento e eles não só recusaram como baixaram o meu limite para US$ 1.000, o que obviamente baixou o meu escore de crédito. Isso ocorreu porque eu estava com muitos pedidos de crédito no meu relatório.
Mas voltando ao escore de crédito. Existem dois modelos de numeração. O modelo tradicional, chamado FICO, é um número que varia de 300 a 850. Através deste link você pode ver melhor como este número é calculado. Você precisa de um escore de pelo menos 620 para se qualificar para uma hipoteca, mas você terá as piores taxas de juros (as taxas de juros variam de acordo com o seu escore). Quando eu comprei (ou melhor, financiei) minha casa no ano passado meu escore era de 700 e consegui uma taxa de juros de 5,125% ao ano.
O segundo padrão, mais recente, chama-se VantageScore e possui numeração variando de 501 a 990. O problema é que o número em um sistema é incompatível com o número em outro sistema. Eu uso um sistema de monitoramento de crédito (onde mensalmente acompanho a evolução do meu escore de crédito) que usa este novo modelo e neste sistema meu escore está na faixa dos 870 pontos (que não necessariamente é melhor do que 700 pontos no sistema FICO; são sistemas diferentes). Este artigo explica melhor este novo sistema.
Para vocês entenderem melhor eu capturei algumas telas do meu escore de crédito atual do sistema que eu uso (não é grátis). Repare como ele me ajuda dizendo como eu posso melhorar meu escore. Basicamente três coisas estão pegando, não ter um histórico de crédito muito longo (afinal não estou morando aqui há tanto tempo assim), baixo limite nos cartões de crédito e o número de pedidos, como expliquei anteriormente. O legal desse sistema é que ele compara o meu escore com a média das demais pessoas que moram nos EUA.
Ufa! Escrevi bem mais do que eu pretendia, mas está aí, de forma bem completa e detalhada, a minha jornada no sistema de crédito americano. Quando tiver novidades posto aqui.
PS: Peço para não fazerem perguntas sobre a compra de imóveis nos EUA ainda, pois eu contarei em detalhes o que aprendi até agora em outro tópico, assim que tiver um tempo sobrando.
Abraços,
Gabriel Torres